O Design do Dia a Dia #1 — A psicopatologia das coisas do dia a dia
O nosso dia a dia é repleto de objetos com os quais interagimos. Uns mais complexos, outros mais simples. Na maior parte do tempo, nós não refletimos sobre esses objetos e interações, até que algo dê errado. Este livro aborda objetos do dia a dia sob três campos de estudo: desenho industrial, design de interação e design de experiência.
Design Centrado no Humano
Design centrado no humano é uma filosofia de design que busca focar as necessidades e expectativas das pessoas que utilizam os produtos projetados. Bom design é boa comunicação, especialmente comunicação de máquina para pessoa, indicando o que ações são possíveis, o que está acontecendo e o que irá acontecer.
Designers também devem considerar que as coisas podem dar errado.
É aí que o bom design é essencial. Designers precisam focar em casos onde as coisas dão errado, não só quando ocorre o planejado.
Quando o sistema destaca os problemas e se comunica com as pessoas, elas entendem o que deve ser feito e corrige o problema. É aí que grande parte da satisfação mora, pois usuário se sente no controle da situação e em colaboração com o sistema.
Princípios Fundamentais da Interação
As interações das pessoas com objetos e tecnologias geram diferentes experiências. O design de Interação tem como objetivo planejar a interação de pessoas com objetos ou sistemas, com base em suas necessidades e expectativas e modelos mentais.
Os princípios fundamentais da interação são :
Possibilidades
São as relações entre as propriedades de um objeto e como elas podem ser utilizadas.
ex: o vidro tem as propriedades de ser transparente e bloquear passagem de objetos. Assim, o vidro possibilita um bloqueio de objetos sem bloquear luz, e assim utilizamos ele em várias aplicações onde essa possibilidade é interessante. Utilizamos vidros em vitrines, janelas, proteção de obras de arte, portas etc.
Significadores
Os significadores são os indicadores das possibilidades, onde e como podem ser utilizadas. Eles servem para mostrar quais ações são possíveis para com um objeto ou tecnologia. Sem significadores, possibilidades podem passar desapercebidas, não utilizadas ou mal utilizadas.
ex: adesivos em portas de vidro indicando “puxe” “ou empurre”. Esses adesivos mostram como se abre a porta, mas também onde executar a ação (empurrar ou puxar).
Sem os significadores, até uma porta pode ser confusa de se utilizar. Imagine uma porta de madeira ou de vidro sem nenhuma maçaneta, adesivo ou adorno. Como abrimos essa porta ? Ela pode girar para a esquerda ou direita, para dentro ou fora, pode deslizar para os lados ou para cima. Sem o significador, a possibilidade não é identificada.
Mapeamentos
Os mapeamentos são as organizações espaciais de informações ou controles que facilitem ações sobre objetos ou sistemas.
ex: as bocas de um fogão dispostas em 2 dimensões (retângulo ou quadrado) e as válvulas que controlam essas bocas, dispostas em uma só dimensão(linear). Esse é um mapeamento dificulta saber qual válvula controla qual boca do fogão. Outro exemplo de mapeamento é o de interruptores acordo com a disposição espacial das respectivas lâmpadas.
Feedback
É a resposta do objeto ou sistema à uma ação. Feedback é a forma dos objetos comunicarem o resultado da ação do usuário ou se o objeto ao menos detectou esta ação. Feedback são comunicados através de sinais visíveis, audíveis, táteis, olfativos ou palatais. Essas respostas ou mensagens devem ser precisas, específicas, claras, sem atraso e na quantidade correta.
ex: após clicarmos no botão “enviar” em algum formulário digital ou e-mail, esperamos uma confirmação de que a ação foi registrada e tudo deu certo. Se não acontecer nada ao apertarmos o botão ou voltarmos à alguma página inicial, não teremos certeza se a ação foi registrada, se algo deu certo ou errado.
Modelos conceituais
São explicações ou simplificações utilizadas para descrever como algo funciona. ex: sistema de arquivos e pastas no computador, ajuda as pessoas criarem o conceito de que há pastas e arquivos dentro do computador. Já os “modelos mentais” são os modelos conceituais na mente das pessoas, que representam como as coisas funcionam. Esses modelos mentais podem ser diferentes de pessoa pra pessoa; eles podem ser simples e superficiais, contanto que o funcionamento do objeto ou serviço esteja alinhado com eles. Ou seja, modelos conceituais precisam ser claros e/ou estar de acordo com os modelos mentais das pessoas.
Um bom modelo conceitual nos permite prever os efeitos das nossas ações.
ex: uma sala de aula será utilizada em 5 minutos, sua temperatura atual é de 27 °C e precisa ser transformada rapidamente para 20 °C com o uso de um aparelho de ar-condicionado. Muitas pessoas acreditam que se colocarem a temperatura mínima(ex:15 °C) como alvo do ar-condicionado, ele chegará mais rapidamente aos 20 °C, pois no modelo mental delas, a temperatura mínima como alvo irá fazer o ar-condicionado entrar em potencia máxima. Mas o que acontece é que o ar-condicionado sempre está em potência máxima, enquanto não atinge a temperatura alvo.
A Imagem do Sistema
Nós criamos modelos mentais para tudo, pois eles nos ajudam a entender o mundo, as pessoas e nós mesmos. Esses modelos têm base em experiências, educação e treinamento. A imagem do sistema, nada mais é que o conjunto de informações que os usuários têm em mente sobre como algo funciona, como também a informação disponível sobre seu funcionamento; seja a estrutura do produto, manuais, experiência com produtos semelhantes, memórias ligadas àquele tipo de produto etc. É da imagem do sistema que vêm os modelos mentais das pessoas. Se um produto se comporta ou funciona de forma diferente de produtos muito semelhantes, ele precisa comunicar seu modelo conceitual de forma clara e fácil ao entendimento dos usuários.
O Paradoxo da Tecnologia
A tecnologia nos oferece o potencial de tornar a vida mais fácil e prazerosa. Cada dia, mais e mais soluções são criadas, destinadas a específicos problemas. Mas ao mesmo tempo, aumenta a complexidade dos sistemas e objetos que utilizamos. Cada vez mais, criamos dispositivos capazes de fazer mais e mais coisas no nosso dia a dia. Por exemplo os smartwatches, que já são complexos e avançados e suficientes para nos ajudar em várias atividades produtivas e pessoais do dia a dia. Mas ao passo que se adiciona tantas coisas para se controlar, menos espaço temos para controles ou significadores. A melhor solução seria criar padrões a serem seguidos, para que possamos aprender os controles apenas uma vez.
A mesma tecnologia que simplifica a vida proporcionando mais funções em um único dispositivo, também complica a vida ao tornar este dispositivo mais difícil de aprendê-lo, de usá-lo. Esse é o paradoxo da tecnologia e o desafio do designer.
O Desafio do Design
O design necessita de uma cooperação de várias disciplinas. Ao desenvolver um produto, uma disciplina requer que ele tenha boa usabilidade, outra quer que o produto seja confiável, possível de se produzir; já outro setor diz que o produto tem que ser economicamente viável. Para que um produto tenha sucesso, todas essas demandas tem que ser atendidas através da colaboração de todos esses setores. Quando essas disciplinas trabalham separadas, há um grande risco de erros e problemas graves.
O desafio é utilizar os princípios do Design Centrado no Humano para produzir resultados positivos, produtos que melhoram vidas e adicionam prazer e proveito. A meta é produzir um ótimo produto, um que os usuários amam. Pode ser feito.